A parte que falta

02.04.2008_

E depois de uma viagem tão boa, com amigos tão queridos, por lugares tão bonitos, eu volto à rotina com a sensação de que algo me falta. Aquele sentimento de coisa nova que deve vir depois dessas experiências ficou grudado e escondido na fresta de algum muro branco das casas de Granada. Eu busquei ele lá e busco agora em minhas memórias.

Em Santiago me ensinaram que escorpianos, como eu, querem tudo em suas profundezas, que não é na superfície que satisfazemos nossas ansiedades. Acho que assim começo a entender as frustrações que sinto depois das viagens.

Ir a lugares bonitos, famosos, é legal sim, mas não parece valer completamente se não acontece uma situação nossa, minha, que outra pessoa que visitou o mesmo lugar não pode contar. Não tem graça se não faz um cleck dentro de mim, se não tenho um momento pqp.

Ficar no raso do turismo me chateia, me parece vazio demais. Claro que não invalida os momentos divertidos que tivemos como grupo (ou trio, no caso :), o sublime das construções e vistas, mas falta o meu, a mudança que o lugar deve provocar em mim. Talvez tenha me faltado conversar mais com as pessoas, essa parte humana, o diálogo que os muros, portas e passagens da Alhambra não podem me dar. É que quando há troca de palavras e nos reconhecemos ou desconhecemos no outro, nos conhecemos também. Eu acho que pode ser assim minha explicação.

De qualquer maneira, acredito que o cleck ainda pode vir depois, em minhas lembranças da viagem, como aconteceu mais ou menos com Paris. Ou talvez eu esteja querendo demais em encontrar a luz sem ter feito o caminho de santiago com meus amigos. :P

Em Bilbao

Pra localizar nossas pessoas queridas na cidade em que estamos vivendo, Edivaldo se deu ao trabalho de montar uma panorâmica feita de cima do parque Etxebarria.




Cliquem na imagem pra vê-la em tamanho grande. :)

Presente de natal tardio



23.03.2008_

Quando é que perigar perder um trem de bilhetes já comprados, passar a noite em claro arrumando a mala e a casa e sair zumbi no frio da madrugada começa a ficar divertido? Quando neva. :)

Nossa desgraça começou quando fomos verificar o ônibus para San Sebastián (de onde saía nosso trem pra Galícia) e descobrimos que já não havia mais plazas. Desespero; enfiei um monte de coisas na mochila, deixei outro tanto pra trás.

E agora? Edi, que consegue pensar mesmo em desespero, saiu fazendo uma penca de ligações e descobriu que podíamos alcançar o trem em Vitoria (uma das três capitais do País Vasco).

Na saída, na correria, no desligar todos os interruptores e levar todos os sacos de lixo, perdemos o Renfe. Mesmo sem dormir, mesmo com folga, perdemos o trem. É, essa é uma das nossas habilidades. Então corremos pra pegar o ônibus. Foi aí que comecei a entender o propósito de tudo aquilo: das janelas amplas vimos todos os montes - não muito, mas também não pouco distantes - nevados. Até agora a neve insistia em cair lá no alto, onde os olhos se perdiam num horizonte de curiosidade infantil. Mas esta noite, em que choveu granizo como em nenhuma outra, ela se mostrou bem ao alcance de nossos olhos, que foram colhendo cada estradinha e telhado nevados com a maior satisfação que se possa imaginar.

E no caminho pra Vitoria, os pinheiros foram ficando confeitados, açúcar fininho nos fazendo ainda mais crianças. E foram virando glacê grossa à medida que a estrada subia. Nossos olhos sem conseguir acreditar num doce daqueles. E na última meia hora de asfalto, finalmente ficamos debaixo da peneira do confeitero, com o açúcar caindo diante mesmo de nossos olhos.

Vitoria era uma cidade branca, toda branca. Ficamos por quase duas horas na estação de trem sem conseguir acreditar que toda aquela nevasca estava ali caindo pra gente. Brincando, jogando, descobrindo que a bola de neve tem o peso exato pra cair na cara do outro, descobrindo que a neve nevando é mesmo uma coisa mágica, que você só consegue ficar admirando com cara de bobo, mas que é incapaz de fotografar ou segurar.

E no fim dessas duas horas de sonho, de presente de Natal americano deslocado três meses, só pude entender que tem coisas que dão errado pra dar certo.








Tem um vídeo da abestalhação da gente no bus pra Vitoria.